segunda-feira, agosto 24, 2015

Assador com carne mas sem brasas

Uma jornada desprovida de triunfos dos três 'grandes' é algo verdadeiramente incomum. É lógico que não se pede que, à 2. jornada, o futebol praticado tenha a qualidade que se exige aí com mais um mês de competição em cima, mas há um mínimo de qualidade e de constância que, principalmente, quem joga para o título deve produzir.

Sendo certo que nenhum dos candidatos ao título venceu nesta jornada (FC Porto e Sporting empataram na única grande falha que os seus defesas cometeram e, por sua vez, com várias ocasiões de golo perdidas), houve um cujo futebol praticado meteu verdadeiro dó e esse foi o da única equipa que perdeu: a do Benfica.

O triunfo por 4-0 ao Estoril trouxe a ilusão de que, conforme indicara Rui Vitória na conferência de imprensa que antecedera esse encontro, a equipa começava a "entrar nos eixos", mesmo que somente durante 15 minutos e só depois de o técnico visitante, Fabiano Soares, ter mexido muito mal nas suas peças.

E, no entanto, foram precisamente esses 15 minutos os únicos que se aproveitaram nos 180 mais descontos das duas jornadas agora concluídas.

Tirando aquele quarto-de-hora em que tudo correu bem, o futebol do Benfica tem sido desconexo. Nas ligações entre sectores e dentro dos próprios sectores.

Mais do que saída de Maxi Pereira ou a lesão de Salvio, o futebol do Benfica ressente-se mais pela falta de um avançado com a mobilidade e disponibilidade que Lima trazia ao jogo ofensivo do conjunto. O brasileiro percorria toda a frente de ataque na procura da bola e sabia sempre, depois, onde encontrar Jonas (tal como já o fizera com Rodrigo). E os dois sabiam, depois, contemporizar até às subidas dos alas e até dos laterais.

Agora, tem sido Jonas, alguém sem a mesma disponibilidade física de Lima, a ter de fazer a mesma função para Konstantinos Mitroglou e, eventualmente, para Raúl Jiménez. E estes apenas parecem mexer-se quando a bola passa por perto.

Sem Lima, a pressão alta e sufocante acabou e as equipas adversárias passaram a poder construir os seus ataques a bel-prazer. E isto porque, sem dois avançados pressionantes, dois médios-centro atrás passam a ser poucos para as batalhas do meio-campo quando não têm a posse da bola.

E, sendo eles insuficientes (para mais se os médios-ala não ajudarem ora a fechar ao meio, ora no apoio aos laterais), os adversários atacam pelo caminho mais curto: pelo centro.

Obviamente, um dos centrais tem que subir na tentativa de ajudar a recuperar a bola mais à frente e acaba por desequilibrar a equipa no seu posicionamento, principalmente o da defesa. Aí, ora se explora o espaço momentaneamente desocupado pelo central ou se aposta em carregar o lateral que, entretanto, fora compensar ao centro. E é de onde os cruzamentos mais perigosos têm partido. E, ao meio, o entendimento entre Luisão, Lisandro López e o médio mais recuado (Fejsa ou Samaris) dista anos-luz da perfeição.

A falta de avançados e médios pressionantes traz todos os problemas de posicionamento já mencionados, que acabam por sobrar, depois, para Júlio César.

Não fosse este tratar-se de um guarda-redes de categoria mundial e a atravessar um excelente momento de forma e o Benfica estaria, não a dois, mas a seis pontos do líder Arouca, seu carrasco desta noite, dadas as defesas feitas, também, com o Estoril. E só estranharia quem não tivesse visto os encontros das duas primeiras jornadas.

Só se trata de um problema de jogadores se os avançados tiverem sido mal escolhidos para o 4-4-2 (ou 4-2-4) que vigoraram no consulado de Jorge Jesus. Não pressionando os dois (mesmo que um mais do que outro), os adeptos benfoquistas podem dizer adeus, depois, ao futebol de mobilidade e de vertigem ofensiva.

E não é um problema de jogadores apropriados para determinada táctica, porque paira a sensação de que, passadas duas jornadas e três jogos oficiais, Rui Vitória ainda nem tem bem uma ideia quanto ao modelo de jogo a apresentar.

Apenas se sabe que, quando se encontra a perder (como aconteceu frente ao Sporting e, esta noite, com o Arouca, "coloca a carne toda no assador".

A questão é que as "brasas" não chegam à "carne". Pura e simplesmente porque o "assador" foi, entretanto, apagado por outro comensal (o adversário). Ou não aqueceu o suficiente na preparação ou, pior ainda, nem sequer trabalhou.

quarta-feira, agosto 12, 2015

A fome e a vontade de comer

"Junta-se a fome à vontade de comer" é um dos provérbios mais conhecidos da língua portuguesa e pode muito bem exemplificar como uma aliança supostamente improvável, como a de FC Porto e Sporting, serviu para liderar o apoio e, chegada a altura, as intenções de voto na candidatura de Pedro Proença à presidência da Liga de Clubes.
Uma pessoa bastante entendedora e muito bem relacionada no mundo do futebol português dissera-me, sensivelmente a meio de Junho, que o Sporting se preparava para atacar aquilo que entendia ser o "status quo" do futebol lusitano, propondo e apoiando, primeiro, uma alteração estatutária na Liga de Clubes e, num segundo momento, a candidatura de Pedro Proença à liderança daquele organismo.
Fiquei a pensar no que me dissera, mas, em bom rigor, não fiz muito caso por uma multitude de factores, começando pelo facto de, em entrevista dada em devido tempo ao diário desportivo Record, Proença dissera-se disponível para ajudar o futebol português e, mais que provavelmente, no seio da FPF e do seu Conselho de Arbitragem, assim como nas instâncias internacionais (passou, entretanto, a fazer parte do Comité de Arbitragem da UEFA).
Mas a verdade é que o Sporting e o FC Porto, supostamente desavindos em público, começaram a sua caminhada rumo ao topo das cúpulas do futebol português promovendo, mesmo que através de propostas diferentes embora com o mesmo objectivo, o regresso do sorteio (mesmo que condicionado) dos árbitros. Algo verdadeiramente original entre os principais campeonatos do Mundo e medida que nunca contou com o apoio dos próprios juízes de campo (uma vez que estes defendem a máxima "os melhores árbitros para os melhores jogos") nem mesmo do agora presidente da Liga.




Cantou-se vitória na Assembleia Geral da Liga na qual a medida foi aprovada por maioria, mas mandava a precaução que assim não fosse, uma vez que a medida tinha que passar na Assembleia Geral da FPF, que tem um universo eleitoral completamente diferente. E, em boa verdade, a medida não passou, pelo que ainda não será na nova temporada que se reeditará o sorteio dos árbitros, essa singularidade lusitana.

Tanto FC Porto como Sporting encontraram nas arbitragens os "bodes expiatórios" perfeitos para épocas de (apenas relativo) insucesso (no caso leonino). E urgia terminar com o ascendente do Benfica, para mais após sagrar-se bicampeão nacional.

Vítor Pereira, que durante seis anos, ocupou a liderança do Conselho de Arbitragem, primeiro na Liga e depois na FPF, sem que o FC Porto apresentasse razões de queixa durante todo esse período (ao ponto de, após o adiamento devido ao estado alagado do relvado de um V. Setúbal-FC Porto, curiosamente dirigido por Proença, o presidente do FC Porto ter dito que "estar sempre a falar de árbitros é ridículo e estúpido, mas como há muitos estúpidos vamos continuar a falar disso"), deixou, ao que tudo indica, de servir nos últimos dois anos. E não é difícil adivinhar porquê.

Entretanto, Bruno de Carvalho chegou à presidência do Sporting e, talvez para cair mais rapidamente nas graças dos adeptos, não conseguia evitar falar do rival de Lisboa em boa parte das suas intervenções públicas e, depois, como os resultados desportivos não eram os que desejava para o ressurgimento do leão (principalmente o domínio da Liga NOS pelo Benfica) tratou rapidamente de desvalorizar e desdenhar os feitos deste. Começou por abrir guerras em praticamente todas as frentes (até internas), mas acabou por aliar-se a um dos declarados "inimigos", Jorge Nuno Pinto da Costa, visando derrubar do cadeirão da Liga alguém, Luís Duque, que, entretanto, colocara em causa no seu clube, levando, mesmo, à sua suspensão de sócio e votando ao lado do líder portista na questão do regresso do sorteio dos árbitros.



Quando chegou à presidência da Liga, Luís Duque contou com o apoio de Benfica, FC Porto e Sp. Braga, pelo que boa parte dos observadores entendeu a posição como se tratando de um ataque e uma provocação ao Sporting. Entretanto e uma vez que havia que encontrar justificação externa ao clube para um retorno zero na época que o dragão mais investiu, o FC Porto encontrou em Vítor Pereira (e, por tabela, em Luís Duque) o "bode expiatório" perfeito.

Como tal, nada como promover a candidatura de alguém com quem sempre teve boas relações e que, por seu turno, abomina(va) o presidente do Conselho de Arbitragem, para além de ter relações complicadas com o Benfica. A partir do momento em que Pedro Proença se revelou disponível para presidir à Liga, mercê de uma significativa vaga de apoio capaz de lhe valer a vitória eleitoral, o FC Porto e o Sporting e os clubes que circulam em seu redor, que haviam feito parte da unanimidade na votação da moção de confiança a(o trabalho de) Luís Duque no Conselho de Presidentes de clubes da Liga, mudaram a agulha.

De apito pendurado desde o início do ano, Pedro Proença, entretanto o mais consagrado árbitro português de todos os tempos, seria, também pelas relações privilegiadas com FC Porto e Sporting, clube com o qual trabalhou desde o início de 2015 em "questões de arbitragem", e pela animosidade de que é alvo da parte dos Benfica - em virtude de arbitragens, no mínimo, polémicas em encontros do actual bicampeão nacional, principalmente em dois jogos com o FC Porto - perfeito para ser lançado numa candidatura capaz de arredar Luís Duque da Liga.

Pedro Proença, por seu turno, não demorou a zurzir em Vítor Pereira, figura de quem nunca gostou particularmente. Em Janeiro, em entrevista ao diário Record, não escondeu a sua mágoa por não ter dirigido a final do Mundial 2014, dizendo que tal não aconteceu por falta de peso de Portugal nas instâncias internacionais da arbitragem e porque não se sentia institucionalmente protegido e apoiado pelo Conselho de Arbitragem da FPF, acontecendo o mesmo com a final do Mundial de clubes.

Todavia, uma das razões pelas quais Pedro Proença não dirigiu a final do Maracanã entre Alemanha e Argentina, talvez sendo, até, a principal de todas, foi porque teve um erro com toda a influência no resultado do México-Holanda, dos oitavos-de-final: assinalou uma grande penalidade favorável à Holanda frente ao México (entretanto convertida por Klaas-Jan Huntelaar), já em período de descontos, após um "mergulho" de Arjen Robben (entretanto assumido pelo próprio), bem na frente do árbitro de baliza e do árbitro assistente.


É certo que o mundo da arbitragem em Portugal não é um mar de rosas (bem antes pelo contrário), mas muito já foi feito para dotar os árbitros de elite nacionais das melhores condições possíveis para o desempenho da função, como o lançamento do profissionalismo. Vítor Pereira colocou-se na mira dos críticos com algumas nomeações de árbitros completamente insensatas (se bem que todos os árbitros da 1ª categoria têm, na teoria, condições para dirigir qualquer jogo), as classificações dos árbitros pelos observadores regem-se por critérios que pouco ou nada têm de transparentes e a possibilidade de as notas dos relatórios poderem ser alvo de revisões propostas pelos clubes serve como eventual forma de condicionamento de futuras arbitragens.

A juntar a isto, há a assinalar a despromoção de escalão do árbitro internacional Marco Ferreira e a sua nomeação para dirigir a final da Taça de Portugal, sabendo Vítor Pereira a sua classificação antes de nomear o funchalense para a decisão do Jamor. Marco Ferreira era (ou ainda é) um excelente juiz de campo (que, por sinal, teve a pior nota da época quando dirigiu um escaldante Sp. Braga-Benfica com vitória dos bracarenses) e foi, por isso, com enorme espanto (para mais, após ter dirigido e bem a final da Taça de Portugal) que se ficou a saber da sua despromoção de escalão, como corolário de uma péssima média de notas da parte dos observadores de árbitros.

Os lados verde e azul não demoraram a encontrar nexos de causalidade entre duas derrotas do Benfica em jogos dirigidos por Marco Ferreira e a despromoção do juiz. Aqueles clubes que apoiaram com sucesso uma candidatura à presidência da Liga visando a potenciação e maximização do produto-futebol e a recuperação da credibilidade são aqueles que, depois, levantam suspeição, como no caso de Marco Ferreira, contribuindo ainda mais para a descredibilização do mesmo produto que visa(va)m voltar a credibilizar.

Sejamos claros. O problema do futebol português nunca foi a Liga em si. Essa sempre foi mais um pretexto e um campo de batalha. Os problemas têm estado invariavelmente relacionados com os chamados "jogos de poder" (sempre envolvendo os "grandes"), visando - apesar da enumeração de outras intenções sempre edificantes - principalmente, o controlo da arbitragem. Isto por os mal-sucedidos candidatos ao título considerarem que tem sido por culpa dos homens do apito que não têm cumprido os seus objectivos (o actual vice-presidente do Benfica, Rui Gomes da Silva, andou muito calado estas duas épocas que passaram, independentemente de a razão lhe assistir de forma pontual, logo ele que era o mais vocal dos críticos das arbitragens nacionais).

E, face ao clima existente e às constantes queixas de arbitragem dos lados vermelho, verde e azul (principalmente quando não ganham), à violência fora de campo que tem marcado alguns "derbies", é natural que se considere que o futebol português seja falho de credibilidade, com dirigentes de clubes sem qualquer elevação, com discursos belicistas e, no fundo, pouco preocupados com a constante desvalorização do "produto-futebol", com jogos habitualmente disputados em estádios vazios (excepto quando actuam os chamados "grandes") e com resultados falseados, através de arbitragens tidas, em algumas situações, como pouco isentas. O caso de Marco Ferreira foi apenas mais um que surgiu que só penaliza a imagem generalizada que se tem do futebol português.

Pedro Proença teve um discurso de tomada de posse mobilizador, mas, mais do que o praticamente impossível trabalho de voltar a unir todos os clubes em seu redor, se atendermos aos resultados das eleições para a presidência da Liga (venceu com apenas 58,8% dos votos, sendo que os votos dos clubes da Liga NOS valiam a dobrar), encontrará dificuldades em fazer melhorar a imagem da Liga NOS no exterior, para uma eventual comercialização dos direitos televisivos e, com isso, aumentar as receitas dos clubes que nela participam.




Ainda assim, desejo a Pedro Proença toda a sorte do mundo - para bem da melhoria do futebol português no seu todo - para a tarefa hercúlea que se prepara para enfrentar. Desejo-o, embora tenha seríssimas dúvidas que consiga ter os resultados que se propõe a atingir, mormente enquanto persistirem certas mentalidades caciquistas, personificadas e defendidas por dirigentes mais preocupados em salvar a própria pele do que em defender os interesses que afirmam querer valorizar.

quarta-feira, julho 29, 2015

O mais gastador aponta dedo aos gastos dos outros




A menos de duas semanas do arranque de mais uma temporada da Premier League, José Mourinho, deu início aos seus "mind games", visando as equipas adversárias do campeão em título inglês, o seu Chelsea. O treinador português acusou Liverpool, Manchester United e Manchester City de quererem, face ao valor das suas contratações, "comprar o título", quando comparado com a relativamente modesta campanha de aquisições dos "Blues".


No entanto, ontem vieram alguns números a público que deitam por terra o discurso do treinador português. Assim, contas feitas englobando as suas passagens por Chelsea, Inter Milão e Real Madrid, Mourinho é o técnico mais gastador de sempre, tendo, desde 2004, ano em que ingressou na agremiação londrina pela primeira vez, beneficiado de aquisições cujas somas ascendem a 903 milhões de euros.


"Quando o Sr. Abramovich chegou ao clube, o Chelsea, diziam eles, comprava o título", referindo-se a parte dos 1.472 milhões de euros que o multimilionário russo gastou na contratação de jogadores desde que, em 2003, comprou o clube de Stamford Bridge a Ken Bates. "Agora, são eles que estão a comprar o título. Todos eles [referindo-se a Manchester United, Manchester City e Liverpool]. Cabe a nós sermos fortes, combatê-los e, obviamente, tentar e conseguir derrotá-los de novo. Mesmo sem esses grandes investimentos".


A "auto-vitimização" de Mourinho, embora se perceba claramente a intenção, não tem grande adesão junto da opinião pública (nomeadamente, a inglesa), principalmente a partir do momento que alguém recorda que os "Blues" atacarão a nova temporada como campeões em título, depois de, ainda na época passada, terem feito investimentos "menores" em elementos como Cesc Fàbregas (37.6), Diego Costa (45.2) e Juan Cuadrado (38.1) ou, a meio de 2013/14, Nemanja Matic (29.7).


O segundo posicionado da lista dos treinadores que mais dinheiro dos seus clubes aplicaram em contratações é precisamente o sucessor de Mourinho no Real Madrid: Carlo Ancelotti. Somados os preços dos jogadores contratados por "Carletto", durante as suas passagens, não só pelos "merengues", mas, também, por Milan, Chelsea e Paris Saint-Germain, temos que as contratações disponibilizadas ao italiano totalizaram 881 milhões de euros, apenas menos 22 milhões do que aqueles de que beneficiou o português.


Roberto Mancini e Manuel Pellegrini são os treinadores que se seguem na lista. Têm o ponto comum de ambos terem sido campeões com o Manchester City e de ambos terem antecedido Mourinho em dois clubes ("Il Mancio" no Inter Milão, Pellegrini no Real Madrid). O técnico transalpino investiu 667 milhões, ao passo que o chileno (que se mantém nos "citizens") aplicou 645 milhões, divididos por Villarreal, Real Madrid e Málaga, para além do conjunto inglês.


O quinto posto é ocupado por um técnico que passou 26 anos no mesmo clube, tornando essa agremiação, o Manchester United, na maior potência inglesa e uma das mais fortes do planeta: Alex Ferguson. 465 milhões de euros em 26 anos é sensivelmente metade do que Mourinho gastou em somente 11 anos. E diz bem da diferença de paradigma e mentalidade entre os dois. Ferguson contratava pontualmente, uma vez que apostou com mais empenho nos jogadores formados pelo clube, principalmente depois de ter restruturado a rede de observadores e os escalões de formação dos "Red Devils". Mourinho, talvez por lhe exigirem sempre resultados "para ontem", contrata(va) compulsivamente, não se importando muito de vazar os bolsos dos patrões. Assim, contratar Asmir Begovic para colmatar a saída de Petr Cech ou o empréstimo de Radamel Falcao para obstar à saída de Didier Drogba constituem excepções à regra habitual.


Arsène Wenger, há 19 anos no Arsenal, tem números comparáveis aos de Sir Alex: 428 milhões de euros investidos em jogadores. Tanto um como outro acredita(va)m fortemente na formação de futebolistas e tinham, igualmente, bastante jeito para tal.


Josep Guardiola, enquanto treinador do Barcelona e Bayern Munique, beneficiou sempre dos produtos das excepcionais "canteras" dos clubes mencionados, mas, ainda assim, uma vez servir dois dos mais poderosos clubes do Mundo, teve a possibilidade de contar com um lote de futebolistas contratados avaliado em 391 milhões de euros.


Um dos clubes que mais se tem aplicado no mercado de transferências tem sido o Atlético Madrid. O seu treinador, Diego Simeone, é o oitavo posicionado neste "ranking", tendo trabalhado com novos jogadores avaliados num total de 246 milhões de euros, maioritariamente aplicados pêlos "colchoneros", mas também divididos por Racing Avellaneda, Estudiantes, River Plate e San Lorenzo.


A lista é encerrada por Louis van Gaal (que gastou 240 milhões em contratações enquanto treinador do AZ Alkmaar, Bayern e Manchester United) e Jürgen Klopp (181 milhões de euros aplicados em contratações como técnico do Mainz e do Borussia Dortmund).

quarta-feira, julho 22, 2015

Um real Porto de abrigo para Casillas

O comunicado através do qual o Real Madrid anunciou formalmente que Iker Casillas, "o maior guarda-redes da nossa história", estava a deixar o clube para ingressar no FC Porto surgiu precisamente (ao minuto) cinco anos após ele a Espanha terem começado o prolongamento frente à Holanda que daria o título mundial ao país vizinho.

Trata-se de uma notável ironia do destino, mas, ainda assim, típica de "San Iker". Para além de todos os troféus que conquistou e para além de todo o seu inegável talento, Casillas é um daqueles desportistas a quem as coisas teimam invariavelmente em "acontecer". Desde esquecer-se de registar o boletim de apostas dos seus pais num dia em que teriam ganho uma boa quantia de dinheiro, até irem buscá-lo a uma aula para viajar até à Noruega e ser, com 16 anos, o guarda-redes suplente do Real Madrid num encontro da UEFA Champions League frente ao Rosenborg, há qualquer coisa de magnético neste indivíduo que atrai "acontecimentos".




Quando não era a primeira opção para a baliza da Espanha, o seu rival nessa altura, Santiago Cañizares deixou cair a garrafa de "after-shave" e cortou-se, ferindo-se com a gravidade suficiente para ficar de fora do Mundial 2002, na Coreia/Japão, deixando o caminho aberto para Casillas poder tornar-se no titular indiscutível da baliza da "Roja".
Depois, quando este "Madridista" dos quatro costados descobriu o seu alter-ego futebolístico, teve que ser um igualmente talentoso catalão e igualmente fanático "culé", Xavi. A admiração era mútua e a amizade retribuída em igual quantidade, dado tudo porque passaram nas selecções espanholas, mesmo sendo cada um a bandeira maior do rival.

Quando perdeu a titularidade pela primeira vez na carreira, por Vicente Del Bosque, em 2002, foi precisamente para se sentar no banco na final da UEFA Champions League disputada no mítico Hampden Park, em Glasgow, frente ao Bayer Leverkusen. A baliza seria entregue a Cesar. Mas, como já se viu, falamos de Casillas. A sua carreira mostra que não é apenas ele que influencia os grandes acontecimentos na sua vida desportiva… As coisas parecem acontecer-lhe, sem que, no entanto, faça grande esforço por isso.
A final de 2002 estava no seu possível ponto de viragem: O Real Madrid estava em vantagem, por 2-1, mas o Bayer Leverkusen parecia cada vez mais forte e pressionava fortemente à procura de um empate e os madrilenos, mais velhos e experientes e com mais jogos nas pernas, começaram a vacilar fisicamente. E eis, então, que Cesar se lesionou.

Parecia mal-preparado para entrar em campo e logo para o jogo mais importante do calendário clubístico internacional. Em face disto, pairava no ar a sensação que, mais tarde ou mais cedo, o Bayer Leverkusen empataria e levaria a decisão para o prolongamento e, eventualmente, para as grandes penalidades. Ao invés, Casillas, então com 20 anos, conquistou a sua segunda medalha de vencedor da UEFA Champions League com um conjunto de defesas miraculosas (com particular destaque para uma com os pés, a remate de Dimitar Berbatov a menos de um metro da baliza).


A partir dessa altura, tornou-se numa das figuras mais reverenciadas do Real Madrid, estatuto que manterá até ao final dos seus dias, dada a longevidade e sucesso da carreira ao mais alto nível. Mas mesmo que Cesar não se tivesse lesionado… as coisas continuariam a acontecer a Casillas. E acredito ser por razões como esta que existe muita gente que não gosta dele e que há um tom generalizado de "subvalorização" em seu redor, mas que apenas ganhou a luz do dia apoiada pela decisão de Mourinho em conceder a titularidade a Diego López.

A sua alcunha, "San Iker", surgiu após darem conta que salvou clube e selecção com mini-milagres praticamente a cada jogo (sim, houve uma época em que o Real Madrid foi a equipa que mais remates sofreu em direcção às suas redes). No entanto, o uso da alcunha também deixava no ar a ideia de que Casillas beneficiava, de alguma forma, de protecção divina. Essa sorte e uma vida de privilégio teriam simplesmente caído ao seu colo. 

Obviamente, não acho que tenha sido assim. Parte da sua grandeza – e sim, considero Casillas um dos melhores guarda-redes de todos os tempos, mesmo não sendo particularmente famoso no jogo aéreo ou com os pés – é que ele escolhe fazer as coisas acontecerem. É ele quem escolhe o seu trajecto (como ingressar no FC Porto, quando tinha contrato por mais dois anos com o Real Madrid, de quem continuaria a ser, certamente, capitão de equipa), o seu carácter, a sua forma de ser, o seu estilo de guarda-redes ou a forma como mantém as suas relações pessoais – para o bem e para o mal.

Os seus momentos mais importantes ocorreram sempre em duelos individuais, fosse em lances de bola corrida ou em desempates por grandes penalidades. Toda a gente se lembra da final do Mundial 2010, em que negou por duas vezes o golo perante um isolado Arjen Robben, jogador que, no entanto, quatro anos depois, no Brasil, fez praticamente o que quis do guarda-redes espanhol, naquela que foi a pior noite da sua carreira futebolística.


E é principalmente naqueles momentos em que as responsabilidades recaem sobre os seus ombros que Casillas mais brilha. É alguém que toma decisões acertadas em fracções de segundo, pouco preocupado por ter os olhos do Mundo sobre si, alguém que assume responsabilidades. Tanto dentro como fora dos relvados.
Portanto, quando chegou à altura do desempate por grandes penalidades na meia-final do EURO 2008 entre a Espanha e a sua "bête noire" Itália, Casillas não quis quaisquer conselhos ou verificar dados estatísticos relativamente aos potenciais marcadores italianos. Disse ao treinador de guarda-redes José Manuel Otxotorena que iria seguir os seus instintos e que queria ficar sozinho com os seus pensamentos e sexto sentido.



Casillas foi à procura do sucesso e repetidamente o foi conseguindo. Durante as suas três conquistas da UEFA Champions League sofreu apenas um golo (o de Diego Godín, na final de 2014, em Lisboa, frente ao Atlético Madrid, no qual teve uma saída dos postes para tentar interceptar o cruzamento que o deixou a meio-caminho e a socar o vazio). No entanto, o erro de Casillas foi emendado no último minuto pelo amigo Sergio Ramos e quase sublimado no prolongamento com os golos de Gareth Bale, Marcelo e Cristiano Ronaldo. "Eu queria que, naquele momento, o relvado se abrisse e me engolisse", confessou o capitão do Real Madrid no final do encontro.



Enquanto todos se lembram desse erro garrafal de Casillas por ter sido no encontro que foi, assim como pela prestação sofrível, meses depois, com a Holanda, durante o Mundial  2014, poucos se recordam que se trata do guardião com mais jogos disputados ao serviço de uma selecção e que é guarda-redes que mais vezes manteve as suas redes invioladas em encontros pelo seu país.

Ninguém se parece dar conta que, nas últimas seis temporadas na UEFA Champions League, só Manuel Neuer manteve a sua baliza inviolada mais vezes que Casillas (precisamente só mais uma). Trata-se de um registo absolutamente fenomenal, uma vez que o Real Madrid não é propriamente conhecido pela sua impermeabilidade defensiva.

Nenhum destes factos "aconteceu" a Casillas. Antes foi ele quem os fez acontecer. Há muito que Casillas decidiu pretender ser ele próprio e, em abono da verdade, nunca foi um "pé de microfone" ou um "pau mandado" de alguém de dentro do clube, fosse ele treinador, dirigente ou mesmo o presidente. Sempre disse ao longo dos anos que preferia ser recordado antes como "um homem decente" do que como "um grande guarda-redes", tema que voltou a repetir no domingo, quando se apresentou sozinho perante os jornalistas.

Portanto, quando chegou a altura, como capitão do Real Madrid e da selecção de Espanha, Casillas sentiu ser chegada a hora de manifestar-se contra a "política de terra queimada" protagonizada por Mourinho que visava desestabilizar o Barcelona de Josep Guardiola. As guerras do "El Clásico" alimentadas pelo treinador português haviam atingido níveis de elevada perversidade e ameaçavam acabar com a harmonia existente na selecção espanhola, a poucos meses da tentativa de revalidação do título europeu em 2012, o que, como se sabe, até veio a acontecer.

O mais fácil seria, como alguns fizeram, apenas defenderem as posições daqueles para os quais trabalhavam diariamente. Mas Casillas nunca escolhe o caminho mais fácil, como ficou demonstrado com a saída para o FC Porto. Após a batalha que foi a Supertaça espanhola de 2011, foi ele que, como capitão de Espanha, ouviu o aviso do seleccionador Del Bosque, que alertava para que o problema fosse resolvido pelos próprios jogadores antes que ele próprio o resolvesse de forma inequívoca.

Casillas telefonou a Xavi e a Carles Puyol, não para pedir desculpa pelo que a animosidade de Mourinho trouxe ao "Clássico", mas para dizer que aquilo "tinha que acabar. Há que assumir mutuamente as responsabilidades. Independentemente das divergências entre clubes, temos um Campeonato da Europa para ganhar no próximo Verão". Assumiu uma posição difícil, auto-sacrificando-se em prol do seu país.
Mourinho, claro está, não aprovou e, à primeira ocasião, tratou de retirar-lhe a titularidade, lançando uma campanha na imprensa que visava desacreditar o capitão da sua própria equipa. Em Dezembro de 2012, concedeu mesmo a baliza a Antonio Adán, que acabou, sem surpresa, por comprometer quando foi chamado a defender a baliza do Real Madrid, e teve que esperar até ao início da temporada seguinte para poder voltar a retirar a titularidade a Casillas.



Pouco depois, Casillas lesionou-se e teve a maior paragem competitiva da sua carreira. Há quem diga que, desde então, nunca mais foi o guarda-redes autoritário e fiável que garantia vitórias. E sim, é verdade que não mais regressou a níveis próximos do apogeu da sua carreira. Mais ainda no que toca à selecção espanhola do que ao Real Madrid, o seu declínio nos últimos dois anos tem sido evidente. Mas, de repente, Casillas deu-se conta que o seu treinador mais lhe parecia um inimigo do que o seu técnico.

Casillas confessou que se sentiu "isolado, como se tivesse a peste" e manifestou o seu choque por, de repente, começarem a surgir vários artigos de opinião nos quais o tratavam por "traidor" e como "o bufo do balneário".

Convém referir que, na única época do consulado de Mourinho em que o Real Madrid nada ganhou foi na temporada em que Casillas, primeiro, perdeu a titularidade e, depois, se lesionou. Também não deixa de ser curioso que, na primeira época de Carlo Ancelotti como técnico dos "merengues", na qual lhe permitiram jogar "apenas" na UEFA Champions League e Taça do Rei, o Real Madrid venceu ambas as provas nas quais contou com Casillas como titular, mas perdeu a Liga na qual foi suplente de Diego López.
Durante a fase mais tumultuosa da sua vida, tanto desportiva como pessoal, Casillas também bateu um recorde para jogos sem sofrer golos tanto na Taça do Rei como na Champions League. Após a opção de Mourinho de lhe retirar o estatuto de indiscutível, Casillas ainda conquistou mais quatro troféus pelo Real Madrid, tendo mantido as redes invioladas em duas dessas finais. Mas, ao passo que as escolhas de Mourinho foram efectuadas pelas piores razões, criaram amarguras desnecessárias e, em última análise, se revelaram desacertadas, foi precisamente a mesma essência das escolhas pessoais e profissionais de Casillas que acrescentaram razões às do seu treinador para que este lhe virasse as costas.



O guarda-redes de 34 anos é um futebolista "muito particular". É alguém que parece ter atitudes mais próprias de tempos idos. Aqueles que beneficiam do seu talento aceitam que Casillas faz as coisas à sua maneira. Ele escolherá, por vezes, envolver-se na sua própria bolha e ficar apenas com os seus pensamentos – depositará inteira confiança nas suas próprias capacidades e instintos, mais do que nas técnicas e metodologias modernas do treino.

Isto significa que, com esta forma de ser, quando as coisas não lhe correm de feição e numa altura em que é cada vez mais necessário combater a idade com o mesmo empenho com que se luta frente a adversários e inimigos, Casillas tem pouco onde e em quem se apoiar. Nos tempos de hoje, o futebolista que abraça as formas de pensar e tecnologias mais modernas, que se adapte melhor e que se der conta que "as coisas não serão sempre da forma como são actualmente" será aquele que melhor lidará com os momentos menos bons. No entanto, conforme Paul Anka escreveu para a canção eternizada por Frank Sinatra, Casillas faz as coisas "à sua maneira".

E isto é, sem dúvida, algo que sempre fez confusão a Mourinho, Ancelotti e aos respectivos treinadores de guarda-redes, Silvino e Villiam Vecchi, respectivamente. Já Vicente Del Bosque, talvez por conhecer Casillas desde muito jovem, lida com as suas idiossincrasias e aproveita esse conhecimento mais aprofundado para extrair o melhor rendimento do guardião, sendo que o último Mundial (mais concretamente os jogos com a Holanda e Chile) constituiu a excepção a uma regra de sucesso.

Outra coisa que não foi muito bem recebida por Mourinho foi a visão que Casillas tinha da capitania do Real Madrid. O guarda-redes considerava que discutir (discutir, contrariar e, por vezes, mesmo lutar verbalmente) com Mourinho fazia parte das funções do cargo que ocupava, uma vez fazê-lo, em seu entender, para bem da equipa e do clube. Isso era Casillas a agir e não a deixar as coisas acontecerem por si. E se isso perturbou(-o) e erodiu o seu próprio estatuto no seio do clube e dos seus adeptos, ao ponto de as suas decisões levarem a que alguns ficassem contra si, tanto melhor. Tenho dúvidas que Casillas se tenha arrependido das suas decisões ou que não voltasse a fazer tudo de novo, caso tivesse que reiniciar a carreira.

Casillas disse, ainda no final de Maio, que não conseguia "conceber-se noutro clube na próxima época". Disse também que acolheria de braços abertos o novo treinador do Real Madrid, Rafa Benítez, e que encararia de bom-grado ter de discutir a baliza do clube com David De Gea, caso este fosse contratado ao Manchester United, para além de ter recordado todos que não havia qualquer cláusula no seu contrato que dissesse que tinha de ser o titular do Real Madrid.

Casillas pensava e queria ficar no clube que o acolhia há 25 anos. No entanto, foi sentindo cada vez mais resistência à sua continuidade da parte, entre outras pessoas, do presidente do clube, Florentino Pérez. Ao mesmo tempo, o homólogo do FC Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa, incentivado pelo treinador Julen Lopetegui, com quem já trabalhara nas camadas jovens do Real Madrid, fizeram-no sentir-se mais desejado no Porto do que actualmente na capital espanhola, apresentando uma proposta concreta aos "merengues" e garantindo ao guarda-redes um estatuto à prova de bala enquanto trabalhasse para os azuis e brancos.



E, apesar de os seus pais (com quem está de relações cortadas desde que lhes tirou o controlo da empresa que haviam criado consigo para gerir os seus investimentos) não lhe terem feito quaisquer favores - ao criticarem fortemente Florentino num dos mais importantes jornais espanhóis, ao mesmo tempo que consideraram o FC Porto como uma opção de "Segunda [divisão] B" para o seu filho continuar a carreira e alertaram para que o seu filho "não terminasse na 'bancarrota', como Vítor Baía" [atitude que levou Casillas a pedir desculpas directamente ao antigo guardião do FC Porto, um dos seus ídolos de infância], é claro que Casillas se sentiu forçado a sair do clube da sua vida.

Tal como Del Bosque, Fernando Hierro, Fernando Morientes ou Raúl antes de si, a saída de Casillas foi somente mais uma de uma lenda do clube alvo das purgas típicas de Florentino Pérez, pese embora a ideia que este quis fazer passar a quando da conferência conjunta de despedida convocada à pressa, de que fora Casillas a pedir para sair, instando os "merengues" a aceitarem a proposta do FC Porto e a pagarem a diferença que restava do seu contrato para os valores propostos pelos portistas.

Não havia qualquer obrigatoriedade da parte do Real Madrid em garantir-lhe a permanência no plantel. O clube estava no seu pleno direito de reestruturar o plantel e planear um futuro sem o guardião de 34 anos. É uma das lendas vivas do Real Madrid, mas não tinha automaticamente que fazer parte do futuro do clube, tanto a curto como a médio prazo.
Mas onde o Real Madrid falhou foi no seu tratamento com o jogador desde os últimos dias de 2012. Tem havido uma falta de classe, de respeito e de reconhecimento por aquilo que fez pelo clube e que nem a cerimónia de despedida arranjada à pressa no último dia conseguiu fazer disfarçar.


O desporto (e o futebol em especial) está cheio de situações assim. E, apesar de o tempo de Casillas no clube que ajudou a tornar ainda maior do que era estivesse mais próximo do seu final do que o desejado pelos seus apoiantes, haveria, certamente, uma forma mais graciosa para o final de uma relação de 25 anos. Mas, tal como aconteceu com casos anteriores, o Real Madrid não entendeu desse modo ou não quis que assim fosse.
Jordi Alba, lateral-esquerdo do Barcelona e companheiro de Casillas na selecção espanhola, disse, por exemplo, que o seu clube jamais se despediria de Casillas da forma como o Real Madrid o fez, citando o exemplo da saída de Xavi para o Qatar após 24 anos em Camp Nou.

É irónico que as palavras do comunicado do Real Madrid a anunciar o fim da relação tenham sido as únicas manifestações de afecto, contextualização, respeito e reconhecimento daquilo que, com os seus actos, Casillas deu ao melhor clube do Século XX para a FIFA – mesmo quando já tendo vindo tarde demais.

Pode ler-se o seguinte numa determinada parte do comunicado oficial:
"… hoje, o melhor guarda-redes da história do clube e do futebol espanhol parte para uma nova etapa na sua carreira futebolística. Esta despedida evoca milhares de sensações e memórias carregadas de esperança, antecipação, sacrifício, força e triunfo únicas. O Iker tornou o nosso escudo ainda maior. Ele tem sido o nosso capitão e forjou a sua lenda aqui desde que cá chegou, com apenas nove anos.
O nosso clube tem 113 anos e Casillas vestiu a nossa camisola durante 25 desses anos. Durante esse tempo, tornou-se num dos nossos maiores líderes e ganhou o respeito, afecto, admiração e o amor dos adeptos. O Iker deixa-nos, mas o seu legado durará para sempre. A sua atitude e acções nos 725 jogos em que participou com a nossa camisola iluminarão o caminho daqueles que sonham fazer parte desta equipa".


Agora, esperam a Casillas dois anos no FC Porto, onde voltará a estar sob os holofotes, mas, em boa parte, por ser Iker Casillas, o guarda-redes que escolheu deixar o maior clube do Mundo para ingressar na "opção de Segunda B", como disse, de forma algo despeitada, a sua mãe.

Não tendo a grandeza do Real Madrid, o FC Porto é, apesar de tudo, uma equipa respeitada na Europa, que luta por todos os troféus em Portugal, país onde tem sido hegemónico nas últimas décadas e que, mais importante nesta altura para Casillas, o fez sentir-se desejado. Acaba por ser um Porto de abrigo para quem estava cansado de passar constantemente por Reais tormentas.